Por que estamos tão tristes?

É normal ficar triste às vezes. Se permita sentir isso.

“Sad as haunted music in the rain                                                     

It’s born of grief and born of woe

But I hear it call and I’ve got to go

Where can I be headed for

The blues call in my north”

 

“Triste como música assombrada na chuva

Nasce da dor e nasce da angústia

 Mas eu ouço me chamar e tenho que ir

 Para onde posso ir

O blues chama no meu norte”

 

 

Para falar de tristeza é justo começar com uma música da mulher que personifica os blues, seja o estilo musical ou o sentimento, que é a Billie Holiday. Sua voz única e tudo que ela passou na vida contribuíram muito para que ela fosse a intérprete tão poderosa que foi.

Sua vida foi difícil desde a infância, passando pela pobreza, abandono, mais de uma experiência de violência sexual, a necessidade de se prostituir para sobreviver, inúmeros relacionamentos abusivos, afetivos e de trabalho, e a dependência química.

Todas as tristezas que ela passou moldaram quem ela foi, e moldaram também a arte que ela criou, inspirando tantas outras.

Ao nos depararmos com uma história como a dela é inevitável não pensar “como eu posso estar triste se nada disso aconteceu comigo?”, bom, não é necessário ter acontecido nada com você para sentir-se triste. A tristeza existe e só.

Podemos ficar tristes às vezes sem motivo algum. Como se sintonizássemos em alguma frequência que não é a nossa e simplesmente nos sentimos para baixo, desanimadas, sem ver uma perspectiva de que as coisas vão melhorar.

Aliás, ouvir uma música triste quando estamos tristes tem um poder catártico de nos ajudar a melhorar, botar para fora aquela dor.

Mas há uma diferença bem grande em estar triste momentaneamente por algum motivo ou estar triste há muito tempo. Quando estamos tristes por algum motivo, basta resolver essa questão, deixar passar e seguir em frente. Mas quando a tristeza não é algo motivado, apenas sentido, cabe a nós iniciar todo um processo de tentar nos sentir bem.

Devemos lembrar que todo o contexto que vivemos hoje contribui para sentir ao menos uma dorzinha, um aperto no peito. E, diga-se de passagem, quem não está um pouco triste no momento, está vivendo em negação.

E mesmo antes do mundo sofrer com a pandemia, é normal que a vida seja uma sucessão de momentos felizes, tristes e cheios de sentimentos diferentes. É assim a vida mesmo. Nós precisamos ficar tristes da mesma forma que precisamos ficar felizes.

A tristeza é tão importante quanto o amor.

Sentir nossas dores, processar o que nos machuca e está causando a tristeza deveria ser naturalizado como sentir fome ou sono. Sem uma tristezinha aqui ou lá, como valorizamos os momentos felizes? Aliás, as pequenas alegrias que tornam o dia a dia mais leve, seja a sua música favorita tocar em algum lugar sem ter sido você que colocou, uma mensagem saudosa de uma pessoa querida, comer seu prato favorito, um pôr do sol incrível, achar um dinheirinho esquecido, receber um elogio, tudo isso pode passar batido quando não temos com clareza a régua do que é estar triste.

Não podemos esquecer também das questões hormonais e sociais de ser mulher. É comum que pessoas que menstruam sintam uma certa tristeza no período pré-menstrual, isso é verdade, mas vamos além: nós, mulheres, fomos historicamente taxadas de sentimentais demais justamente porque essa própria sociedade nos moldou para o cuidado. Fomos condicionadas à empatia por uma construção social que exige que tenhamos consciência dos problemas do mundo, dos outros, e dos nossos, portanto, sofremos muito com a dor do outro. Somos esponjinhas emocionais.

Em suas obras, Freud e Nietzche, já diziam: o sofrimento é uma travessia a ser percorrida para a passagem à alegria ou para que haja mudança psíquica. Por isso, a tristeza nada mais é do que apenas uma passagem de tempo. Ela também se vai, assim como diversos outros sentimentos.

A felicidade não é a ausência da tristeza.

Viver nessa eterna busca por algo que vai nos causar felicidade momentânea só gera insatisfação e nos faz perder o mais importante que é o caminho. Tudo bem não se sentir assim tão bem agora, permita-se viver esse momento. Viva cada dia, cada humor. Exploda de felicidade quando estiver feliz. Chore até desidratar se tiver vontade. Mas saiba que tudo é transitório.

E já que começamos com uma musa do jazz, vamos terminar com outra, a Paloma Faith. Essa mensagem é para todas nós. <3

 

“Angels watching over me

With smiles upon their face

Cause I have made it through this far

In an unforgiving place

It feels sometimes this hill’s too steep

For a girl like me to climb

But I must knock those thoughts right down

I’ll do it in my own time”

 

“Anjos cuidando de mim

Com sorrisos no rosto

Porque eu cheguei até aqui

Em um lugar implacável

Às vezes parece que essa colina é muito íngreme

Para uma garota como eu escalar

Mas eu devo derrubar esses pensamentos

Vou fazer no meu tempo”

 

 

Ps: Se a tristeza persistir de uma forma muito dolorosa, que esteja te impedindo de vivê-la, algo está errado, procure ajuda profissional.